sexta-feira, 7 de agosto de 2009

as siglas

meus pequenos nomes do meio
minúsculas tentativas de tempo
atrocidades leves de uma guerra
sem o cheiro de sangue nenhum.

o quebrar da seta precoce
uma fragrância sem a sua mentira
onde caminham esses passos súbitos -
vontade antes de tossir?

como o pequeno som da chama
o espinho do cacto que não nasceu
o luto de Niobe antes do choro
efêmeros botões da flor.

somos populados por horas
tão pequenas que nem gozam o parto
mal o mar se alegra e a onda já quebra
cedendo apenas sua emoção.

à árvore do pensamento
pertencem as folhas mais verdes e altas
mas em sua sombra é que, muito rápidas
surgem as sementes vitais.

somos feitos de decisões
coladas atrás dos pilares brancos
que só existem numa fração autômata...
pertencem a nós: mas independem.

terça-feira, 23 de junho de 2009

Lótus

parar a ânsia
engolir os brabos espinhos
do dia
tecê-los como algodão
bordar
repartir o joio
amar
chamar
prescindir
mente corpo estado
desistir para existir

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Cuco

- Olha que coisa mais linda que Deus fez.

- O que, vó?

- O mar, meu filho.

- Isso é só um monte de água.

terça-feira, 26 de maio de 2009

O antiraskolnikov

Trinta e cinco anos depois do primeiro cigarro fumado, sua ex-mulher fala sobre como ele não consegue conviver com ninguém que conduza um intelecto minimamente excitante.
Passaria a noite antes dele aceitar a possibilidade de um novo sol? Apenas o pequeno animal em si, dentro de sua toca, com seus delicados cílios e bigodes, experimentava qualquer movimentação da realidade. A consciência redundava em pirâmides contrárias a qualquer circulação.
E o escuro tornou-se a parte de si que não esperava, num belo gesto ornamental de desejo, portal magnífico de sua dormente sucessão de escolhas e vaidades.
As caixas de vidas empilhadas soletraram seu vôo breve, única sentença verdadeira que havia construído em vida.
A aurora, assim, cativou a todos, num cheiro misto de ciúmes e críticas, pairando em meio ao negligente estrume do corpo em putrefação.
Vendo a notícia na televisão, um pequeno sorriu: o jantar ficara pronto. O macarrão estava bom.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Leite.

a carícia na surpresa
dos teus olhos, branca
tua pele, branca tua face
branco teu desejo sem qualquer
carência, sem sequer
o pessimismo da
prudência -
apenas tocha, apenas
rosa
laranja
pétalas profanas
da particular estação.


as corolas em sabres macios
cítrica
rica lua sazonal...
em um cálice verde
te beberei
para provar do doce amargor que rege
tuas noites de matança
de touradas pueris
massacres
estranhos
distantes desejos e velhas senhoras
a passear calmamente
entre cabras, entre céus, entre léus.
parece-me, pequena
que tua nuvem
tua derme em véu
é tão papel quanto este
é tão virgem quanto este
é tão fina quanto este
e corta tanto quanto este
quando menos se espera
e mais se acaricia:
folha que carece inda
de uma queda
apenas sua.

onde andarás
em tuas divagações sombrias,
em que áfricas existirás, em que
cidades pacíficas e extintas
rugirá a tempestade
que mora em teu semblante?
o que brilha
em teus olhos tão fugazes
que tangem mas não adentram
que queimam mas não estimam;
fogo-fátuo? farol?
esquinas... caracol...
chegarei?
que letra enquadrarias
no frio alfabeto da matilha?
onça-pintada, tigresa nova
felina, apesar do uivo
pesado
que carrega sob o couro.

falas muitas línguas
minha pescoçuda
minha girafinha.
tantas falas que até quem
não te entende te entende
pois o longe sempre é o mesmo
os galhos são sempre os altos
as folhas as verdes
as orelhas sempre as tuas
girafinha..
nasceste em gelo, ó pés
de faminto esquimó.
mas, quiçá, em orvalho raso
em Andes pouco
serra repentina sem estrada
chuva quebrada pelo grito
oco
da sereia que morreu.


sincera ovelha,
balindo de pijama e de tédio..
contemos, pois, francas estrelas
cadenas de sóis, de marés, de vias
lácteas como tu, grávidas como tu
balofa de feno
mansa, triste
cômica, cósmica, cisne
emprestada
como a luz que nos escorrega
goela abaixo
no escuro
sem pureza.
rogo-te bem azeda
framboesa
em combustão
sobre a página
que é meu leito
acesa desse leite
que és tu
em minha semana
tão complicada cama...
durmamos no jardim?

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Cacete!

A conjuntivite é uma das doencinhas mais chatas que se pode ter. Você fica com o olho incomodando, inchado, vermelho, coçando, e ainda por cima com a possibilidade de se autoinfectar, passando para o outro olho, ou infectar seus pobres amiguinhos. Entretanto, não é algo que se trate: os colírios não ajudam em porra nenhuma, a não ser como prevenção para impedir uma infecção bacteriana secundária, visto que a primeira, na enorme maioria dos casos, é viral. Enfim, assim você prossegue, com o olho na merda, sem ter o que fazer, mas sabendo que aquilo ali não causa nada, apenas enche o saco (seu e dos outros). Na moral, como diria meu grande amigo Guigz: get a real fucking disease. Ou como diria eu mesmo: ou trepa ou sai de cima. Né, viruszinho?

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Bifurcação?

Absurdos e verdades são coisas que só acontecem quando falam os corações mais jovens. Depois da dor, sempre há os nunca mais, os até quandos, os medos e receios tão impróprios e tardios quanto velhinhas que assopram velas em seus aniversários, ou ainda quanto um pombo gordo que recusa aquilo que lhe é oferecido. Porém, sempre haverá na arte um cinza de abandono ou uma vírgula que separa um sujeito daquela outra ação, elaborando assim um acalanto que nos conforta o dorso. Fim de contas, sempre poderemos contar com nossa imensa confusão, aquela que dentro do peito faz psiu!, lembrando-nos de nossa sede por salivas, lágrimas e pelos tão doces frutos da expiação...